domingo, 23 de maio de 2021

Que outros países realizam concursos públicos?

 A PEC 32 favorece a contração de cargos em comissão, de livre indicação, em detrimento dos cargos efetivos, conquistados através de avaliações frias e nada subjetivas, os chamados concursos públicos.

Ora, muito óbvio dizer, e eu não vou me alongar muito batendo nesta tecla novamente, que esta ampliação dos cargos em comissão favorecerá muito a indicação de fantasmas que não trabalham e sequer pisam na repartição, além de peculato, na forma do carinhoso apelido de rachadinhas.

Concursos são então fundamentais.

O Banco Mundial, em documento oficial, afirma o óbvio (tradução minha):

Recrutamento com base no mérito - contratação com base na qualidade do candidato ao invés de conexões políticas - forma um pilar básico do  modelo de burocracia weberiano (Rauch e Evans 2000; Bäck e Hadenius 2008). A literatura sobre o assunto, embora limitada, mostra que tal abordagem se correlaciona com o crescimento econômico e níveis mais baixos de corrupção e nepotismo (Rauch e Evans 2000; Cingolani et al. 2015; Meyer-Sahling, Mikkelsen e Schuster 2018; MeyerSahling, Schuster e Mikkelsen 2018). Especialmente onde o sistema de patrocínio é alto, introduzir o recrutamento baseado no mérito por meio de processos civis formais e exames podem ter um impacto significativo (Sundell 2014; Meyer-Sahling, Mikkelsen e Schuster 2018). 

Ou seja, o sistema de patrocínio, e sua coexistência cimentada dentro da burocracia, tornou-se o calcanhar de Aquiles que contribui para os resultados de desempenho financeiro insatisfatório. Isso torna a resolução de problemas de orçamento e diretorias do tesouro, especialmente nos municípios, uma tarefa gigantesca.

As discussões acaloradas sobre a PEC 32 já nós fizeram testemunhar muitas falácias, inclusive insinuações de que não afetaria os concursos - como já demonstrei acima, não é verdade - além de uma pretensa aproximação da seleção pública no Brasil com outros países, seria tal afirmação pertinente?

Afinal...

Que outros países realizam concursos públicos?

Vamos a alguns exemplos, também tirei estes do supracitado documento do Banco Mundial:

França. O sistema francês é um exemplo clássico de um sistema baseado em carreiras. O recrutamento é organizado por meio de um exame competitivo (o chamado concours), e ocorre principalmente no início da carreira. Existem três tipos de exames: um aberto para candidatos externos, um segundo que é aberto apenas a funcionários públicos e outro aberto a funcionários eleitos, gestores de associações e setor privado.

China. O mecanismo de recrutamento chinês de organizado centralmente

exames tem uma história rica, que remonta ao século 7 DC. Um forte enfoque nos valores confucionistas o torna um sistema único. Os candidatos fazem um teste de três partes: 

(i) 140 perguntas sobre lógica, matemática, política e filosofia; 

(ii) uma análise da economia e documentos políticos; 

e (iii) um ensaio relacionado a um tópico de segunda parte. 

Muitas questões dizem respeito à resolução de problemas por meio do uso de princípios filosóficos chineses. 

Cabe aqui ressaltar que alguma regulamentação no Brasil no sentido de fazer concursos com alguns destes parâmetros, seria interessante.

Índia. O setor público indiano tem uma rica história de exames. Para participar do concurso público, o candidato deve ter diploma universitário e ter entre 21 e 28 anos de idade. Existe um único exame para todos serviços administrativos, com a primeira etapa consistindo em dois artigos - um geral e um sobre um assunto de escolha. Se aprovado, o candidato escreve mais oito artigos para a segunda etapa. Finalmente, uma entrevista oral complementa os oito testes escritos.

Cabe aqui ressaltar que, embora robusto e complexo, o sistema indiano não daria muito certo na cultura do Brasil, me refiro especificamente a ultima etapa, de avaliação oral, afinal favoreceria avaliações subjetivas.

República da Coreia do Sul (ou, Coréia Boa, como eu gosto de chamar). O serviço público coreano é um serviço baseado em sistema de carreiras, que combina entrevistas e um exame central, sem requisitos de escolaridade. A primeira etapa consiste em um teste de múltipla escolha, com foco na habilidade linguística e lógica, interpretação de dados, julgamento circunstancial e domínio da língua inglesa. As entradas de grau superior incluem uma segunda etapa. O candidato leva um teste baseado em ensaio, após o qual uma entrevista encerra o processo. Anteriormente, os testes concentravam-se nos conhecimentos jurídicos. Hoje eles enfatizam as competências relacionadas ao trabalho.

Irlanda. A Irlanda é um exemplo de meio-termo entre os sistemas baseados em cargos e carreiras, junto com a Bélgica, Dinamarca e México. Embora inclinado para um sistema de carreira, várias posições de classificação júnior no sistema irlandês são preenchidas através de recrutamento externo e recrutamento interno (como em sistemas baseados em carreira). Os funcionários administrativos são recrutados por meio de concurso público. Esses recrutamentos são baseados nos resultados psicológicos e testes relacionados ao trabalho e uma entrevista final.

Japão. Os funcionários públicos geralmente são recrutados por meio de concursos.

4 comentários:

  1. Tô achando que passei na PF. Fiz 60% da prova de papiloscopista. Sei que está fora do tópico, mas estou muito feliz.

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  2. República da Coreia do Sul (...) "Anteriormente, os testes concentravam-se nos conhecimentos jurídicos. Hoje eles enfatizam as competências relacionadas ao trabalho."

    Basicamente o que ocorre em alguns concursos hoje como PF. Seria um alívio sair um pouco da decoreba insana de letra de lei e cobrar matérias que envolvam mais raciocínio ou algum conhecimento técnico/acadêmico de fato.
    Mas acho que é também fruto do princípio da impessoalidade, afinal a lei está disponível ampla e gratuitamente a todos.

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    1. Concordo, petisco.

      O racicinio até aparece em algumas provas que cobrem interpretação de textos e RLM, porém muito pouco, sendo ofuscados pela decoreba que representa o real ponto decisivo na prova.

      Desse modo, creio que uma regulamentação legal no formato das provas de concurso seria algo interessante de se implementar no Brasil, sempre tendo cuidado, claro, para não dar brechas para eventuais favorecimentos pros amigos do rei.

      Grande abraço!

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Nobres leitores, se eu demorar a responder, é porque provavelmente tô fazendo cosplay de eremita e estudando pra concursos.

Aquila non capit muscas